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O fruto da abertura

Parar também nos traz uma abertura, que é a capacidade de receber os frutos que o mundo tem para oferecer, e de aprender as lições as vida, porque você pode notá-las. O que eu quero transmitir usando a palavra abertura está contido nas seguintes palavras dirigidas a um jovem poeta pelo poeta Rainer Maria Rilke: “Se aquele anjo se dignar a vir, será porque você o convenceu, não por meio de lágrimas, pela sua humilde resolução de estar sempre começando: de ser um principiante”.

Ser um principiante é fundamental. O perito já “sabe” as respostas, e assim se isola e se fecha.

Estar aberto inclui estar disposto a aprender. Para muitos de nós, isso pode ser um desafio. Dizer “não sei”, perguntar “ que é, como é, por que é” pode ser interpretado como fraqueza ou inferioridade, dando a impressão de que você entrega ao outro sua decisão. Mas eu respeito profundamente as pessoas capazes de admitir sua ignorância em um assunto, as que não se apegam às suas próprias opiniões, porque elas estão em busca de crescimento, de maior compreensão através de outras perspectivas. Elas certamente poderão reconhecer o que é melhor para elas e para elas e para aqueles com quem convivem.

Ser receptivo também faz parte de estar aberto. É a capacidade de trazer algo ou alguém para dentro do seu coração e da sua mente. Isso talvez seja um desafio maior ainda em nossa cultura que valoriza os ultra-ativos e agressivos e considera a receptividade menor ou até mesmo uma fraqueza

Nossa atitude diante da receptividade se apoia muito no machismo. Sob um ponto de vista estereotipado, o feminino é receptivo, o masculino é ativo. O ideal, claro, é um equilíbrio e uma complementaridade. Mas a cultura – homens e, infelizmente, mulheres – certamente valoriza, privilegia e recompensa os agressivos. As profissões mais abertas e receptivas a assistência social, o aconselhamento, o magistério e a enfermagem, por exemplo – estão na extremidade mais baixa da escala econômica, o que indica o valor que a sociedade dá a essas qualidades.

Por que a receptividade é necessária? Porque é o meio mais importante de obter informações, perspectiva, conhecimentos ou qualquer outra coisa. Uma vida bem-sucedida exige disposição para aprender e receptividade. Quem está fechado – os donos da verdade – não avança. Para obter qualquer coisa, você tem que estar receptivo a ela. Se não ficamos receptivos – abertos – , perdemos muito do significado daquilo que surge em nosso caminho. Simplesmente não o vemos, embora possa Ter aparecido diante de nossos olhos.

Tente conhecer a coisa da seguinte maneira: se você só for ativo, nunca terá o retorno de que tanto precisa para compreender o resultado da sua ação. A essência do aprendizado é saber o que aconteceu como resultado do que você fez. Então, quando voltar ao modo ativo, estará agindo com base na informação que obteve por estar receptivo. Por ter aprendido.

A pessoa se enriquece ao ser capaz de receber o que está disponível: expressões espontâneas da vida, surpresas e coisas novas.

Minha festa favorita no calendário litúrgico é a festa da Epifania. É comemorada no início da janeiro e assinala o momento em que o Menino Jesus foi apresentado aos Reis Magos do Oriente e, no seu sentido mais amplo, mostrado ou manifestado ao mundo. Epifania é a palavra grega para aparição ou manifestação. Gosto dessa festa porque ela leva a um significado mais amplo: epifanias são todos aqueles momentos grandes ou pequenos em que percebemos algo, obtemos algo pela primeira vez, temos uma “visão”, vemos algo se manifestar de maneira nunca vista antes ou obtemos uma nova compreensão do que a vida é e de como nos encaixarmos nela. Aqueles que estão abertos podem comemorar muitas epifanias durante o ano.

A abertura vai gradativamente diminuindo a censura e a autocensura. À medida que desenvolvemos a prática de Parar, percebemos que é essencial não nos precipitarmos julgando o que vemos, porque sempre poderá haver outro ponto de vista, e de qualquer forma a vida é um processo permanente.

As pessoas fechadas deixam que seu severo crítico interior censure e abafe as percepções que têm e preferem se pautar por padrões rígidos: “Isso é bom, isso é ruim, isso é certo, isso é errado”. Assumem essa atitude com os outros e com elas mesmas. Quanto maior for a abertura, mais ausente ou menos severo será esse julgamento.

Uma escuta acolhedora e eficaz é outro resultado da abertura. Em vez de adotar uma postura defensiva e ficar pensando no que vai responder enquanto alguém lhe fala, você escuta e se torna receptivo à outra pessoa. Você absorve conscientemente o que é dito, o que significa notar o tom de voz, a linguagem corporal e as palavras, ou seja, o significado real do que está sendo dito. Dessa forma, sua resposta terá uma probabilidade muito maior de ser adequada, precisa e eficaz. E lhe dará a tranqüilidade de, se não souber o que responder, dizer que precisa de um tempo para pensar.

Mas antes de escutar os outros, você tem que escutar a si mesmo. Frederick Buechner, famoso autor e clérigo, diz isso com muita clareza na sua obra Now and Then: “Se me pedissem para descrever em poucas palavras a essência de tudo que venho tentando dizer, tanto como romancista quanto como pregador, seria mais ou menos o seguinte: escute a sua vida. Veja o mistério insondável que ela é”. Parar é escutar a sua vida, a fim de poder se abrir o suficiente para ouvir tudo o que há para ouvir. Sem Parar, ficamos tão assoberbados pelo dia-a –dia, que não conseguimos absorver a informação que necessitamos, pois nosso corpo está cheio e não cabe mais nada ali.

Parar, em todas as suas formas, permite que o corpo (você) se esvazie e assim seja capaz de receber ainda mais.

Você deseja se tornar mais receptivo e disposto a aprender ? A nossa cultura não valoriza nem estimula essas atitudes, embora elas sejam fundamentais para o nosso crescimento. A abertura pode parecer estranha e assustadora se você não está acostumado a ela. Tente a seguinte experiência: sente-se numa cadeira num aposento tranqüilo onde você não será perturbado. Mantenha os olhos abertos e relaxe o mais possível por um período de cinco minutos, enquanto tenta não fazer absolutamente nada, mental ou fisicamente exceto notar a sua respiração e o que acontece com você. Fique o mais aberto e receptível possível e observe o que se passa: pensamentos, sentimentos ou sensações. Só isso.

Se isso lhe parece difícil, será mais fácil simplesmente ficar no que se chama “de bobeira”. Planeje algumas horas sem fazer nada, absolutamente nada, e veja o que acontece. Desenvolva sua capacidade de fazer um inventário de si mesmo (O que é que eu estou sentindo agora?) e dos arredores (O que é que está acontecendo aqui?). Você ficará surpreso com o que, depois de algum tempo, vai começar a notar. A questão crucial é continuar assim justamente Quando sentir vontade de parar.

A abertura prioriza a escuta (e não a fala), o receber (e não o dar), o deixar-se cuidar (e não o cuidar dos outros), o silêncio (e não o barulho), a observação (e não a ação), a percepção (e não o comentário) e o aprender (e não o ensinar). Acho importante esclarecer que as características entre parênteses não são de forma negativa. Simplesmente não são o que se precisa fazer quando se quer Parar.

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