“Coitada,
foi usada por aquele cafajeste”. Ouvi essa frase na beira da
praia, num papo que rolava no guarda-sol ao lado. Pelo visto a
coitada em questão financiou algum malandro, ou serviu de degrau
para um alpinista social, sei lá, só sei que ela havia sido usada
no pior sentido, deu pra perceber pelo tom do comentário. Mas não
fiquei com pena da coitada, seja ela quem for.
Não
costumo ir atrás desta história de “foi usada”. No que se
refere a adultos, todo mundo sabe mais ou menos onde está se
metendo, ninguém é totalmente inocente. Se nos usam, algum
consentimento a gente deu, mesmo sem ter assinado procuração. E se
estamos assim tão desfrutáveis para o uso alheio, seguramente é
porque estamos nos usando pouco.
Se for este o caso,
seguem sugestões para usar a si mesmo: comer, beber, dormir e
transar, nossas quatro necessidades básicas, sempre com segurança,
mas também sem esquecer que estamos aqui para nos divertir. Usar-se
nada mais é do que reconhecer a si próprio como uma fonte de
prazer.
Dançar sem medo de pagar mico, dizer o que pensa
mesmo que isso contrarie as verdades estabelecidas, rir sem inibição
– dane-se se aparecer a gengiva. Mas cuide da sua gengiva, cuide
dos dentes, não se negligencie. Use seu médico, seu dentista, sua
saúde.
Use-se para progredir na vida. Alguma coisa você
já deve ter aprendido até aqui. Encoste-se na sua própria
experiência e intuição, honre sua história de vida, seu
currículo, e se ele não for tão atraente, incremente-o. Use sua
voz: marque entrevistas.
Use sua simpatia: convença os outros.
Use seus neurônios: pra todo o resto.
E este coração
acomodado aí no peito? Use-o, ora bolas. Não fique protegendo-se de
frustrações só porque seu grande amor da adolescência não deu
certo. Ou porque seu casamento até-que-a-morte-os-separe durou
“apenas” 13 anos. Não enviuve de si mesmo, ninguém
morreu.
Use-se para conseguir uma passagem para a
Patagônia, use-se para fazer amigos, use-se para evoluir. Use seus
olhos para ler, chorar, reter cenas vistas e vividas – a memória e
a emoção vêm muito do olho. Use os ouvidos para escutar boa
música, estímulos e o silêncio mais completo. Use as pernas para
pedalar, escalar, levantar da cama, ir aonde quiser. Seus dedos para
pedir carona, escrever poemas, apontar distâncias. Sua boca pra
sorrir, sua barriga para gerar filhos, seus seios para amamentar,
seus braços para trabalhar, sua alma para preencher-se, seu cérebro
para não morrer em vida.
Use-se. Se você não fizer,
algum engraçadinho o fará. E você virará assunto de beira de
praia.